sábado, 3 de março de 2012

Para sempre minha amiga... (Rubens Valente)

Poucos amaram tanto a profissão quanto ela. Viveu com o jornalismo na veia. 
Nesse corpo que teimou em falhar onde sobravam a mente e a emoção, tremia a chama verdadeira. 
Por onde passou, fomos todos testemunhas. Sempre a remoer isso ou aquilo, como a dizer que não tinha vindo ao mundo a passeio. 
Quem sabe, essa urgência não era só para nos dizer que seu tempo entre nós era curto - e curto que foi.
Em tardes distantes de Cuiabá, lá pelos idos 1997, um sol de amolecer as idéias, comendo arroz com pequi, eu, ela e o Zé Luís, discutíamos com entusiasmo como seria a nossa microempresa, uma agência de notícias do centro-oeste e da amazônia.
Tudo era ela quem organizava, do cartão de visitas à agenda de fontes, era ela quem incentivava e quem mais sonhava, sonhávamos todos, mas ela sempre mais, e tudo demorou uns seis meses, e até que estava dando certo, (já pagávamos as contas dos telefone, claro o aparelho era dela...), mas aí fomos parando, parando, até trocar o projeto instável pela segurança do ganha-pão.
Anos depois, um amigo, Amaury Jr., estava atrás de um bicheiro de Mato Grosso. Recomendei que a procurasse. Ontem ele se lembrava, ao telefone: "Que  dia triste, ela me ajudou tanto. Que pessoa maravilhosa". 
Ela soube que o colega estava sob ameaça e deu proteção a quem mal conhecia, por meio do jornal em que trabalhava, hospedou-o, deu-lhe abrigo. Mesmo sabendo dos riscos reais que corria.
Em Cuiabá, por essas e outras, deixou tantos amigos, pelas redações as pessoas choravam ontem.
Tempos depois, quando já trabalhava na Câmara dos Deputados, colocou de novo seu emprego em risco para me ajudar - dois gabinetes já haviam recusado o apoio, mas não ela.
Nunca falhou quando dela precisamos, ajudava a todos.
Então um dia, já apartados pela vida, começaram a chegar as primeiras notícias. Demorei a compreender, até hoje não acredito. Ela nunca falava sobre o assunto. 
Jamais ouvi de sua boca uma reclamação sobre saúde, e entendo agora a gravidade do assunto, fico espantado em silêncio.
Numa manhã bonita de sol aberto ficamos sabendo estarrecidos que aquela menina, que queria e podia desbravar os cantos mais remotos, agora já não podia mais.
O físico lhe abandonou. Viveu pautada pela ética. Amou e sofreu. 
Perseguiu seu sonho a vida inteira.Quando a vida começou a lhe fechar as portas, manteve a cabeça erguida.
Foi embora de pé, com aquela mesma firmeza com que caçava suas reportagens. 
Morreu com dignidade.
Ergo um brinde para ela, que viverá em meu coração.
Quantas saudades de JOANICE, para sempre minha amiga, para sempre repórter.
* RUBENS  VALENTE é jornalista...

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